quarta-feira, 26 de março de 2008

Tratando Vicios

PLANETA – Mas qual é a porcentagem de cura? Eu não gostaria de tirar a esperança dos fumantes que desejam se curar do vício...Nogier – As grandes estatísticas têm provado que a aurículo é a melhor forma para auxiliar o fumante. Mas é uma ilusão pensar que está tudo resolvido depois de alguns meses; vários anos depois de a pessoa estar se abstendo de fumar é que se pode considerar o problema sanado. O mesmo se dá em relação às drogas e ao álcool. E é importante deixar claro que não basta só botar agulhas; a acupuntura auricular tem de fazer parte de um contexto de mudança global, no qual se inclui a psicoterapia, por exemplo.
PLANETA – É uma mudança inclusive interior, espiritualizante?Nogier – Por que não? O tabaco é um problema muito, muito difícil. A companhia Philip Morris considera que o indivíduo precisa parar de fumar durante sete anos para se ter segurança de que não voltará a ser fumante. Antes disso, ele continua sendo alvo da publicidade.
PLANETA – Nos Estados Unidos existe um programa de recuperação de drogados que dá como opção ao indivíduo ir para a cadeia ou fazer um tratamento de um ano com ajuda da acupuntura. Existe algo parecido na França?Nogier – Não, não há essa estrutura na França, mas no Canadá existe.
PLANETA – E o que o senhor acha disso?Nogier – Embora eu não tenha experiência própria no caso, acho que deve ajudar, porque temos aí a coisa colocada na globalidade, na modificação geral.
PLANETA – Há cerca de três ou quatro anos, médicos brasileiros vêm tentando monopolizar o uso da acupuntura. Com isso excelentes profissionais não-médicos, técnicos, terão de abrir mão da prática. Como o senhor vê isso, dr. Nogier? Essa situação também ocorre na Europa?Nogier – De maneira geral, espera-se que o médico conheça mais o erro que o não-médico. No caso específico da França, creio que o médico tem pouco tempo para trabalhar com a acupuntura. Talvez a solução fosse fazer como nos países escandinavos, nos quais existem médicos que supervisionam indivíduos que praticam a acupuntura. No caso específico da Escandinávia, onde tenho uma experiência pessoal, o médico tem responsabilidade em relação a qualquer coisa que aconteça com o paciente. Então, ele se encarrega de cuidar o melhor possível da formação de todo o pessoal auxiliar, porque cai tudo nas suas costas. O problema básico, na verdade, é fazer um diagnóstico, saber se aquele caso tem uma indicação precisa para acupuntura. Feito isso, o tratamento passa a ser realizado pelo técnico, uma vez que a acupuntura em si não exige maiores conhecimentos em medicina. Eu mesmo sou tratado por um acupunturista não-médico. Por quê? Porque essa pessoa tem mostrado resultados muito bons. Estou perfeitamente satisfeito com ela.

As Raizes da Auriculoterapia

Raphael NogierNas Raízes da Auriculoterapia

Em recente visita ao Brasil, o médico francês Raphael Nogier, cujo pai descobriu a auriculoterapia, concedeu esta entrevista a PLANETA. Também participaram da conversa, que acabou abrangendo pontos da acupuntura tradicional, o dentista Darwin Caldeira Ribeiro e o médico Jorge Boucinhas, brasileiros que desenvolvem alguns trabalhos com o dr. Nogier.

PLANETA – Quais as diferenças básicas entre a acupuntura tradicional e a auriculoterapia?Nogier – A acupuntura é uma técnica chinesa ancestral, que repousa, até certo ponto, nas noções filosóficas de yin e yang, que são energias complementares. Na acupuntura tradicional, a gente pica os pontos para controlar essa energia, que passa pelos meridianos. Na auriculoterapia não há essa idéia de energia; ela é uma técnica pura e simplesmente ocidental, descoberta em 1951 por meu pai, Paul Nogier, e que repousa em noções neurofisiológicas. A idéia básica é que a representação do sistema nervoso é feita de tal maneira que, na orelha, nós encontramos pontos que representam diferentes órgãos. Ou seja, colocando agulhas nas orelhas nós podemos agir sobre as funções desses órgãos ou sobre as dores nas áreas relacionadas a eles.
PLANETA – É possível fazer diagnóstico através da auriculoterapia?Nogier – Sim. Se nós encontrarmos dor na área da orelha que representa o estômago, por exemplo, sabemos que há algo errado, algo problemático nesse órgão. Também podemos, através de aparelhos eletrônicos, medir a resistência oferecida pela pele da orelha à passagem da corrente elétrica; assim, é possível detectar (já que conhecemos o mapeamento do corpo na orelha) o ponto que apresenta disfunção.
PLANETA – Existe alguma relação entre o uso de brincos e a prática instintiva, digamos assim, da auriculoterapia?Nogier – Realmente é uma coisa interessante essa história dos brincos. Basta lembrar que, em certa época, o hábito de colocar os brincos tinha funções bem específicas. Algumas amas, por exemplo, faziam as crianças usarem brinquinhos no ponto tradicional do olho, o que, entre outras finalidades, parecia ter como objetivo prevenir infecções oculares na criança. Já os piratas árabes utilizavam um brinquinho de ouro nesse ponto provavelmente para aumentar a sua acuidade visual e com isso ver os navios a serem pirateados bem antes de eles próprios serem vistos.Darwin – O Bjorn Borg usava uma agulha grande no ponto do olho, e ele enxergava melhor do que qualquer outro tenista, colocando a bola no limite da linha de fundo da quadra.
PLANETA – Mas, hoje em dia, usam-se brincos até na região da orelha correspondente à coluna vertebral, por exemplo. Isso não pode, de alguma maneira, afetá-la?Nogier – Sim, é possível não somente prejudicar a coluna, como o corpo em geral.

Acupuntura em cirurgias

Entrevista Raphael Nogier

PLANETA – Embora em grandes cirurgias seja perfeitamente possível a analgesia através de acupuntura, no Brasil essa prática ainda está bastante restrita à odontologia. A situação é a mesma na Europa?Darwin – Não. Eu tenho visto isso na Europa, inclusive na França, onde estive recentemente, junto com o dr. Nogier e o dr. Boucinhas, apresentando um trabalho sobre a analgesia por acupuntura auricular, que eu aplico em odontologia. Em Paris, eu vi um trabalho sobre cirurgia toráxica, o que nós estamos começando a fazer agora. Eu tenho um irmão que é cirurgião-plástico e venho fazendo a analgesia por acupuntura para pacientes seus que tiveram acidentes vascular cerebral, choque anafilático ou alérgico. Estamos também iniciando um trabalho agora para cirurgia toráxica.
PLANETA – Nos países do Oriente isso já é comum?Darwin – Sim. Eu cheguei a ver um médico oriental fazer uma cirurgia de um tumor no pulmão usando uma técnica de analgesia com uma só agulha.
PLANETA – E por que ainda não se adota esse tipo de técnica no Brasil?Darwin – Existem poucos profis-sionais da área que se dedicam à analgesia por acupuntura. É preciso, primeiro, conhecer a acupuntura muito bem, exercê-la profissionalmente, para depois fazer isso. E, no Brasil, a acupuntura com essa definição ainda é muito recente.
PLANETA – O medo ou a falta de confiança pode colocar em risco a analgesia por agulhas?Darwin – O medo é relativo, porque o profissional brasileiro tem mostrado que não existe o perigo de dor nem de contaminação, já que se usam hoje agulhas descartáveis. Além disso, os resultados são tão eficientes que fazem com que a acupuntura seja melhor aceita. Tanto que há tramitando no Congresso uma legislação nova para regulamentar a acupuntura.
PLANETA – De que maneira remédios homeopáticos e florais podem auxiliar em tratamentos por acupuntura?Darwin – Eles são ferramentas que se acoplam ao tratamento. Você não pode usar, por exemplo, um supressor, uma cortisona, um corticóide junto com a acupuntura, porque iria diminuir o efeito-resposta do organismo.
PLANETA – Ou seja, a acupuntura é menos eficiente quando se está tomando certos medicamentos…Boucinhas – Cortisona, qualquer psicotrópico, essas drogas mais pesadas para depressão e psicose – aldon, aneuroléticos, propomasina, neuropropomasina e outros psicotrópicos mais fortes – bloqueiam bastante o efeito da acupuntura. Tranqüilizantes mais leves, como benzodiazepan, têm uma pequena ação bloqueadora, assim como os antibióticos.